Dia 1
Aventuras > Algarve de Lés a Lés
Cabo S. Vicente - Monchique Distância: 85.49 Kms
08.10h – Cabo S. Vicente.
Quando sai do carro, a baixa temperatura e o forte vento que se faziam sentir, prometiam uma etapa atribulada. A fixação dos alforges, devido aos eficientes encaixes dos mesmos, foi rápida e a colocação da tenda: saco cama e colchão de ar, foi conseguida com recurso a esticadores elásticos. A primeira foto foi tirada de forma a atestar o local da partida. Despedi-me da minha esposa e iniciei o percurso.
Logo nos primeiros metros, o peso da bicicleta fez-se sentir. As centenas de metros necessários percorrer em asfalto até virar para um caminho em direcção a Vila do Bispo, foram rapidamente ultrapassados. Neste caminho, dividido entre terra e asfalto, encontrei mais areia que o previsto, no entanto, e de uma forma inesperada, o peso adicional que os alforges provocavam na traseira da bike fornecia uma estabilidade na transição deste obstáculo. Alcançada Vila do Bispo, foi necessário rumar a norte, pela Nac.268. Alguns quilómetros à frente deixei esta EN seguindo em direcção a Vilarinha, utilizando uma estrada que embora seja asfaltada, prima pela quase ausência de trânsito. Na parte final dessa estrada, é possível desfrutar uma magnifica vista sobre o silencioso vale que se estende aos nossos pés. Até aqui o trajecto que idealizei através do GPS estava a coincidir na totalidade. Isto possibilitava uma maior rapidez na encruzilhada de estradas que por aqui existe.
Neste cruzamento existem duas possibilidades que me fizeram vacilar, ou seguir uma estrada que serpenteia o seco rio, ou uma subida de forte desnível. Como o GPS indicava a segunda e não tinha qualquer garantia que o rio fosse na direcção que eu desejava, optei pela opção previamente programada. Após passar pelo aglomerado de pedras que já foi um rio, iniciei a forte subida. Aqui pude comprovar definitivamente que a escolha de pneus mistos não traria nenhum problema de aderência mesmo nas piores condições já que o peso adicional na traseira tratava de “colar” verdadeiramente o pneu ao chão. No meio da subida cruzei-me com uma cavaleira, que atendendo a sua cara de espanto, esperava ver tudo, menos alguém a subir o monte de bicicleta com a “casa às costas”. Atingido o cume foi necessário vencer um constante sobe e desce até chegar a um moinho onde a vista existente em 360º era quase infinita. Dai até à Bordeira foi sempre a descer até voltar a entrar numa estrada asfaltada mesmo à entrada desta localidade. A próxima alteração de rumo só aconteceu graças ao GPS. A pequena estrada de terra estava dissimulada de uma forma que, sem recurso ao gps, dificilmente a detectaria.
Depois de atravessar a EN120 entrei directamente numa estrada não asfaltada onde comecei a visualizar o rasto de destruição provocada pelos incêndios que por ali lavraram. Uma paisagem deveras angustiante. Também consequência indirecta dos incêndios, e directa da seca extrema, a Barragem da Bravura, que supostamente um dos seus “braços” deveria chegar até à localidade de Corcino, agora só a grande distancia se visualizava a sua água. Na Romeira parei no café local para um descanso e para repor as energias, comendo uma sandes caseira confeccionada com pão de à três dias, facto que me foi comunicado com a simplicidade de quem não vê qualquer problema neste dado. Depois de alguns minutos em silêncio, a conversa iniciou-se e pude ouvir atentamente as queixas, angustia e revolta de alguém que assistiu na primeira pessoa à destruição da “sua” linda serra pelos incêndios. A voz embargada e o olhar fixo no infinito, tentavam conter a exteriorização dos sentimentos. Esta será uma imagem que guardarei para sempre!
Na saída da Romeira optei por seguir a estrada asfaltada em detrimento da estrada de terra. A temperatura estava a aumentar, já tinha retirado o casaco Corta-Vento (que inicialmente parecia pouco) e ainda muito caminho havia a percorrer, por isso, pareceu-me que através do asfalto mais rapidamente chegaria ao destino. Aquilo que não contava era com 4 km continuamente em ascensão até à EN267 e depois até a Marmelete. Na aproximação a esta localidade, optei por seguir as indicações de Centro e pensei em alterar o local de destino de Monchique para Marmelete. Neste primeiro dia ainda não tinha a confiança necessária para arriscar acampar (em todo o trajecto que planeei não existem parques de campismo). Assim, quando passei em frente à Junta de Freguesia de Marmelete perguntei informações sobre a possibilidade de alugar um quarto por uma noite. Fui encaminhado até à única pessoa que aparentemente presta este tipo de serviço. Após me observar e perguntar para quantas noites era, disse que não tinha nenhum quarto disponível… Está bem, mas poderia dizer simplesmente que não alugava!!! Não restava outra hipótese que não fosse seguir até Monchique, mais 15 km a percorrer. Aqui chegado, perguntei em dois locais onde poderia encontrar uma pensão para ficar um dia. Não tinha interesse em luxos, mas unicamente em retemperar forças para o dia seguinte e ficar descansado com a bike. Assim aconteceu, encontrei uma pensão que me permitiu guardar a bike com uma única condicionante: no dia seguinte só após as 09.00h poderia tirar a bike da garagem. Nesta altura não me pareceu problemático. A única particularidade desta residencial era que a casa-de-banho era comum a todos os quartos…
Após um retemperante banho e como ainda restavam alguns minutos para o jantar resolvi repousar um pouco em cima da cama. Erro! Quando acordei já era muito tarde e o jantar teve de ser uma simples sopa e nada mais. Bem feito! Rapidamente voltei ao quarto e como não existia televisão, escrevi algumas notas sobre o que se tinha passado neste primeiro dia, e a dormida começou cedo, amanhã seria outro dia de aventura.